O cinema é e sempre foi uma figura paterna na minha vida, a ficção alimenta a alma e os documentos saciam a minha sede de conhecimento de mim mesmo através das experiências dos outros.

A arte mãe que explora o que significa ser um ser humano.

Além de Bullet apontar uma intenção, minha jornada tem a capacidade de expressá-la melhor do que meus sentimentos. Sou criador de imagens há mais de 15 anos, primeiro como fotógrafo e depois como cineasta.

Como africano, nesta era digital de conteúdos, a minha missão foi e é de certa forma apresentar-nos a nós, angolanos a angolanos, angolanos ao mundo, na mesma linha que “cidade de deus” fez ao humanizar o típico brasileiro em uma maneira que só o poder do cinema pode fazer.

O enredo para mim é apenas um meio de seduzir o espectador para o subtexto que neste caso é uma exploração de como vive o angolano médio? (Somos um país com idade média entre 18 e 21 anos), quais os desafios que enfrentamos e quais os nossos maiores sonhos e aspirações? E sendo eu próprio um artista, também coloco a questão em forma narrativa: a arte pode salvar as nossas almas?

Lançar uma rede tão elevada pode parecer improvável, mas a conclusão já estava à nossa frente - dificuldades financeiras, falta de água, electricidade e nenhuma maneira de encontrar a energia económica para alimentar os sonhos e talentos de alguém. Neste caso criei X, Maria Madalena e lélé para mostrar esta viagem através de uma moda multicamadas para uma premissa multicamadas.

A sua jornada diária para empregos precários que permitem apenas a sobrevivência, mas não sem esperança, sem família e fé.

Estamos tentando descobrir quem somos, mas Jesus branco ainda está na cruz, estamos nos apegando aos valores cristãos com mais firmeza do que os cristãos originais e lutamos entre esse anseio por comunidade e redenção em uma sociedade que é o pólo oposto de tais ideais, onde não existem redes sociais ou governamentais para nos ajudar.

Eu nos vejo como super heróis e através da banalidade do dia a dia, Mary cozinha e é fiel, lélé é sábio além de sua idade e forja seu próprio destino independente das cartas que ele distribui e X, nosso protagonista é um fantasma que absorve tudo e tenta dar sentido às suas dores e alegrias através dos seus raps e da palavra falada, a “guitarra” do angolano.

Quero revelar nossa beleza para nós e para o mundo.

O cinema é o meu verdadeiro amor e contar histórias é a pedra angular do meu ser.

Hugo Salvaterra.